King Kong volta plagiando Coppola e com Jorge Ben na vitrola
King Kong está de volta às telas.
Como no filme original de 1933, o gigantesco e felpudo gorila continua a seguir a teoria da evolução de Darwin e a ter apetite por loiras. A novidade da superprodução “Kong: A Ilha da Caveira”, lançado simultaneamente nos cinemas dos EUA e Brasil, é que a ação agora se passa em 1973, no final da Guerra do Vietnã.
Trata-se, a princípio, de uma boa sacada do jovem diretor Jordan Vogt-Roberts, de 32 anos, mas fica ai o primeiro sinal de desconfiança, uma vez que a história foi desenvolvida com a ajuda de quatro roteiristas, incluindo Dan Gilroy (indicado ao Oscar de melhor roteiro em 2014 pelo filme “O Abutre”, com Jake Gyllenhaal).
O problema é que, ao fazer essa ambientação, as melhores cenas de “Kong” já são pré-conhecidas do público. Várias beiram o plágio descarado do filme “Apocalypse Now”, que o cineasta Francis Ford Coppola rodou em 1979, e baseado no livro “Coração das Trevas”, de Joseph Conrad, outro “homenageado” da produção. Estão lá uma cena de helicópteros fazendo voo coordenado sob a selva, música de Jimmy Hendrix explodindo dos alto-falantes, e até um momento em que o elenco usa armas lança-chamas feitas com napalm.
Em “Kong: A Ilha da Caveira”, John Goodman interpreta um cientista que vai para Washington D.C., bater na porta de um senador para que o governo financie uma viagem exploratória à pouco conhecida “Ilha da Caveira”, escondida em algum lugar do Pacífico (a maioria das cenas foram filmadas no Vietnã). “Este é o pior momento da história de Washington”, diz Goodman, citando o governo do presidente Richard Nixon, e que agora soa como uma estocada no atual caos desenrolado na capital americana.
Além de levar seus assistentes – seguindo a cartilha da inclusão eles são o ator negro Corey Hawkins (atualmente na TV, como o protagonista da série “24: Legacy”) e a atriz chinesa Tian Ling (atualmente nos cinemas, no elenco de “A Grande Muralha”, o pior filme da carreira do cineasta Zhang Yimou) -, o cientista conta com a ajuda de um mercenário (Tom Hiddleston) e escolta de um pelotão de soldados americanos ainda estacionados no Vietnã, comandados por Samuel L. Jackson (este em melhor interpretação que os demais, fazendo um híbrido dos militares interpretados por Marlon Brando e Robert Duvall em “Apocalypse Now”).
A mocinha da vez – após as versões com Fay Wray (1933), Jessica Lange (1976) e Naomi Watts (2005) – é Brie Larson. A vencedora do Oscar de melhor atriz em 2016 pelo filme “O Quarto de Jack” é, infelizmente, totalmente desperdiçada. Os diálogos dela são risíveis.
Larson também é vítima do diretor e roteiristas que decidiram aplicar um Donald Trump na personagem dela, uma fotógrafa “anti-guerra” da revista “Life”. Esse quinteto desrespeita os reflexos mais elementares de uma jornalista. A fotógrafa não se importa em acionar sua Leika diante de momentos de significantes descobertas científicas, como na primeira aparição de Kong ou quando seu grupo topa com uma vala coletiva, onde estão os esqueletos dos familiares do gorila e de outras espécies gigantescas jamais catalogadas. Quando finalmente aciona sua câmera, ela é econômica, registrando apenas uma imagem de cada situação para a revista famosa por ter sido uma das mais importantes publicações do jornalismo fotográfico do mundo. Difícil acreditar que ela carregava pouco filme na mochila, uma vez que a marca Kodak faz merchandising em mais de uma cena de “Kong”.
Segundo o jornal “Los Angeles Times”, “Kong” custou US$ 185 milhões para ser rodado. Trata-se de um orçamento 185 vezes maior que o filme anterior – e de estreia – de Vogt-Roberts: o ultra-indie “Os Reis do Verão”, apresentado no Festival de Sundance de 2013. Todas as poucas aparições de Kong no filme (críticos americanos reclamaram do gorila ter assumido o posto de coadjuvante na história) são incríveis. O gorilão nunca esteve em forma melhor, graças ao trabalho dos gênios dos computadores da empresa Industrial Light & Magic. Outros monstrengos do filme, como uma aranha e um louva-a-deus gigantescos, são desnecessários.
A trilha sonora de “Kong” contem clássicos do pop da década de 70, interpretados por David Bowie, The Stooges, Creedence Clearwater Revival e Black Sabbath. A música “Brother”, do álbum “A Taça da Liberdade”, de Jorge Ben Jor, aparece numa cena em que Brie Larson (finalmente) decide clicar com sua câmera os integrantes de uma tribo de nativos que habita a ilha.