Famosos de Hollywood têm nova obsessão: editoras de livros
O novo símbolo de status em Hollywood não é ter uma grife de roupas como as irmãs Mary-Kate e Ashley Olsen ou o músico Kanye West. Muito menos uma linha de produtos cosméticos como Kim Kardashian, fábrica de tequila como George Clooney ou items de decoração como a apresentadora Ellen DeGeneres.
Cool agora, por entre celebridades, é ter uma editora de livros como é o caso de Johnny Depp, Viggo Mortensen e Gwyneth Paltrow. Ou, usando suas fortes vozes em plataformas de mídia social, recomendar obras literárias para os fãs como são os casos das atrizes Reese Witherspoon, Lena Dunham e Emma Watson.
Se fama é moeda forte, porque, então, não usar esse tipo de comércio para vender um produto que não seja uma futilidade e, em alguns casos, pode gerar um debate inteligente? Essa é a conclusão de Witherspoon, atriz que também, recentemente, se juntou à mulheres da política de Washington na campanha #askhermore (#pergunteaelamais), criticando a cobertura frívola e sexista dos repórteres de entretenimento e de moda que querem saber do “who are you wearing?” (quem fez sua roupa?) ou mostrar na TV se a cutícula e os diamantes estão em dia na mega-reprovada “manicam”, a câmera-manicure do canal E!
Fã de literatura (os escritores preferidos dela são Amy Bloom, Raymond Carver, Alice Munro e Nicky Hornby) e cansada de receber propostas para fazer comédias românticas inócuas de Hollywood, Witherspoon decidiu unir o útil ao agradável: montou há dois anos, em parceria com uma amiga, a produtora Pacific Standard.
A empresa tem ênfase em desenvolver novos projetos para o cinema e TV a partir de adaptações de livros inéditos, que estão quase prontos ou com a primeira fornada saindo em direção às livrarias. Segundo o Wall Street Journal, Witherspoon “se tornou uma das mais influentes lançadoras de tendências literárias”. “Escritores são meus roqueiros”, disse a atriz à mesma publicação, que trouxe um perfil dela em sua edição desta sexta-feira (8).
O sucesso de Witherspoon começou com a compra dos direitos de adaptação cinematográfica de dois livros que viraram best sellers internacionais: “Livre” e “Garota Exemplar”. O primeiro, escrito por Cheryl Strayed e que narra a história real da escritora que, depois de vários dramas pessoais, embarca numa viagem de auto-descobrimento pela costa do Pacífico, trajeto de mais de 1.700 quilômetros, que faz andando, virou filme estrelado por Witherspoon e que culminou numa indicação para o Oscar de melhor atriz para ela no ano passado. Já “Garota Exemplar”, thriller da ex-jornalista da revista Entertainment Weekly Gillian Flynn sobre marido acusado de ter matado a esposa que desapareceu, Witherspoon decidiu ficar só na posição de produtora-executiva, abrindo mão do papel principal. Este ficou com a atriz inglesa Rosamund Pike que, coincidentemente, concorreu ao Oscar contra a patroa no ano passado. Ambas perderam para Julianne Moore (“Para Sempre Alice”). Juntas, essas duas adaptações renderam mais de US$ 400 milhões nas bilheterias mundiais.
A companhia de Witherspoon tem atualmente 26 projetos em diversos estágios de andamento. Desses, 16 são baseados em livros. Ela ou recebe manuscritos diretamente (lê em seu iPad) ou garimpa títulos menos manjados, sem grande campanha de marketing, visitando livrarias independentes perto de sua casa em Santa Monica, na Califórnia. Às vezes descobre de jeito prosaico: folheando a seção de resenhas de revistas, como foi o caso de “In a Dark, Dark Wood”, de Ruth Ware, thriller psicológico descoberto nas páginas de O, a revista mensal de Oprah Winfrey.
Para a surpresa da atriz, alguns livros que recebe ou descobre não têm ainda seus direitos de adaptação vendidos. Ela costuma brigar por eles rapidamente. Em alguns casos, perde para conhecidos. Nicole Kidman, que vai contracenar em breve com Witherspoon, comprou os direitos de “Reconstruindo Amélia”, best seller da estreante Kimberly McGreith sobre crime num colégio do Brooklyn, Nova York. Já “É Isso que eu Faço”, livro de memórias da fotógrafa Lynsey Addario, que documentou o regime Talibã, no Afeganistão, e o drama de refugiados de Darfur, no Sudão, foi adquirido pelo cineasta Steven Spielberg, que pretende dirigir a adaptação para o cinema.
A atriz costuma caprichar nas fotos de seus livros favoritos, arranjando-os ao lado de flores, sob mesas ou em toalhas de praia enquanto toma sol, divulgando-as então para seus 5.7 milhões de seguidores no Instagram. Witherspoon adora escritoras. Ela também descobriu um sub-gênero que caiu no gosto popular após as publicações de “Garota Exemplar” e, em seguida, de “A Garota no Trem”, de Paula Hawkins: thrillers psicológicos com mulheres e seus segredos.
Witherspoon fisgou mais dois projetos do gênero. Ao lado de Nicole Kidman, Laura Dern e Shailene Woodley, ela vai aparecer na adaptação de “Pequenas Grandes Mentiras”, da escritora australiana Liane Moriarty, A produção televisiva da rede HBO conta a história de três amigas de uma pequena cidade que dividem segredo. “O livro é engraçado e assustador”, aprovou o mestre do terror Stephen King. Nos cinemas, Witherspoon vai aparecer na adaptação de um dos livros mais comentados de 2015, o thriller “Luckiest Girl Alive”, da escritora estreante Jessica Knoll, que conta a história de uma jornalista de uma revista feminina, de vida glamurosa em Nova York, que é obrigada a confrontar-se com trágico incidente ocorrido em seus tempos de colegial. O livro vendeu mais de 450 mil exemplares nos quatro meses que figurou nas listas dos mais vendidos nos Estados Unidos. O apoio de Witherspoon foi creditado ao sucesso do livro.
“Luckiest Girl Alive” também chamou a atenção da atriz Lena Dunham, que o recomendou para os 400 mil assinantes de sua newsletter “Lenny Letter”. Recentemente eleita uma das das pessoas mais influentes da mídia novaiorquina por conta dessa newsletter distribuída duas vezes por semana, Dunham costuma indicar livros de temática feminina como “Giving Up the Ghost”, biografia da escritora e ensaísta inglesa Hillary Mantel; “Slow Love”, da editora-chefe Dominique Browne, que fala sobre sua vida depois que a revista House & Garden, da Condé Nast, fechou em 2007; e “So Sad Today”, que traz os ensaios pessoais da escritora e poetisa Melissa Broder, criadora da famosa conta do Twitter @sosadtoday.
Outra atriz com ênfase na literatura feminista é a inglesa Emma Watson, a Hermione Granger da cinesérie “Harry Potter”, que recentemente criou o clube de livros “Our Shared Shelf” (Nossa prateleira conjunta), título que seus 21 milhões de seguidores no Twitter a ajudaram a escolher. Ela já indicou a biografia-ensaio da feminista Gloria Steinem,”My Life on the Road”, e o clássico moderno de Alice Walker sobre escravidão americana, “A Cor Púrpura”. O último livro recomendado por Watson foi “How To Be a Woman”, da comediante inglesa Caitlin Moran.
Witherspoon, Dunham e Watson são filhotas da madrinha literária Oprah Winfrey que, em 1996, iniciou seu Oprah’s Book Club, um quadro dentro de seu talk show exibido todas as tardes até 2011. Em seus 15 anos de sucesso e 70 livros recomendados, Oprah fez os americanos se apaixonarem novamente pelo escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez (ela indicou ambos “O Amor nos Tempos do Cólera” e “Cem Anos de Solidão”) como alavancou as vendas de obras de Cormac McCarthy, Jonathan Franzen (que não gostou de ser selecionado por ela, e foi chamado de “elitista” por Andre Dubus III), Toni Morrison e Alice Hoffman.
A apresentadora também esteve no centro do escândalo do livro de memórias “Um Milhão de Pedacinhos”, do escritor James Frey, segundo maior sucesso do BookClub dela, e com várias passagens sobre alcoolismo e tratamento a qual o autor foi submetido questionadas, antes de ele assumir publicamente que as tinha inventado. Outro nome com poder parecido com o de Oprah é o chefe-executivo do Facebook, Mark Zuckerberg, que passou a recomendar livros (ele fez a promessa de ler dois por mês) a seus mais de 55 milhões de seguidores. O primeiro deles, “O Fim do Poder”, de Moisés Naim, fez com que a pequena editora dele, a Basic Books, fosse pega de calças curtas, sem estoque pronto para dar conta da grande demanda nas livrarias.
Oprah, que deu uma repaginada em seu BookClub depois de se aposentar de seu talk show (ele agora chama Oprah’s Book Club 2.0), vai lançar no ano que vem sua própria editora, dentro da empresa Flatiron Books. O primeiro lançamento será o aguardado livro mezzo autobiografia, mezzo autoajuda, “The Life You Want”. Depois, ela pretende colocar no mercado vários títulos de não-ficção. Esse também é o plano de Lena Dunham, que lança a editora Lenny, dentro da empresa RandomHouse, em 2017.
Chegando na frente delas está a atriz Gwyneth Paltrow que, nesta terça-feira (12), lança o primeiro livro de sua editora Goop Press, junto a empresa Grand Central Publishing, do grupo Hachette. “It’s All Easy” é um livro com 125 receitas (o terceiro lançado pela atriz, que é boa cozinheira), algumas delas já publicadas no vilipendiado (pela mídia) e de bastante sucesso (de público) website/newsletter de estilo de vida Goop, criado pela atriz em 2008. Paltrow vai seguir o mesmo nicho de livros culinários do restaurauter Anthony Bourdain, dono do restaurante Les Halles, em Nova York, e apresentador do programa “Parts Unknown”, da rede CNN, que, em 2012, lançou a editora Ecco, dentro da HarperCollins.
Cineastas também estão flertando com o mundo literário. Em 2012, Brett Ratner (de “A Hora do Rush” ) criou a RatPac Press e seu primeiro lançamento foi o thriller de conspiração “Seven Wonders, de Ben Mezrich, autor de “Bilionários Por Acaso”, sobre a criação do Facebook. No mês passado, o site “Deadline Hollywood” foi o primeiro a anunciar a criação da Michael Mann Books, editora do cineasta de “Fogo Contra Fogo”, de 1995. O primeiro livro da editora de Mann será justamente uma prequel da história deste filme policial, contando a história dos “anos formativos” dos personagens interpretados por Al Pacino, Robert De Niro e Val Kilmer.
O pioneirismo das celebridades com editoras de livros pertence ao ator dinamarquês radicado em Hollywood Viggo Mortensen que, em 2002, lançou em Santa Monica, Califórnia, a Perceval Press. Mortensen foi chamado na época, pelo jornal New York Times, de “o magnata indie das editoras”. A Perceval é especializada em livros de poesia, fotografia, ensaios de críticas e de viagens. Um de seus lançamentos recentes é o livro “Hijos de la Selva”, editado por Mortensen e com textos de Frederico Bossert e Diego Villar sobre o explorador alemão Max Schmidt, que, na década de 30, documentou e estudou as culturas indígenas em Mato Grosso, no Brasil, e em áreas remotas do Paraguai.
Mais recentemente, em 2012, foi a vez do ator Johnny Depp criar a sua editora, a Infinitum Nihil. Entre os lançamento de Depp estão um livro inédito de ficção do músico Woody Guthrie, “House of Earth”, e “The Unraveled Tales of Bob Dylan”, compilação de textos feita pelo historiador Douglas Brinkley. Ao lançar sua parceria com a editora HarperCollins, Depp deu a seguinte declaração: “Eu juro, em nome da Infinitum Nihil, que vou dar o meu melhor para lançar publicações dignas do tempo dos leitores, e do interesse deles. Publicações essas que talvez nunca teriam pulado do parapeito”.