Dilma Rousseff faz ‘ponta’ em livro infantil sobre Hillary Clinton

Marcelo Bernardes

Uma leve, divertida e inspiradora aula feminista ou uma ferramenta política que varre para debaixo do tapete alguns escândalos? Fofurama ou megalomania?

Dois livros ilustrados, voltados para garotas entre 4 a 8 anos e que estão sendo lançados nos Estados Unidos, exploram o lado “girl power” de Hillary Rodham Clinton, a pré-candidata do Partido Democrata à presidência americana. Em um dos livros, Hillary é comparada a ícones da história como a Rainha Elizabeth e Joana d’Arc. Em outro, aparece ao lado de inúmeras poderosas, incluindo a presidente Dilma Roussef, a chanceler alemã Angela Merkel, as atrizes Angelina Jolie e Meryl Streep, as cantoras Madonna e Barbra Streisand e as escritoras J.K Rowling e Maya Angelou.

Hillary Clinton e as mulheres poderosas. (Foto: Reprodução)
Hillary Clinton e as mulheres poderosas, incluindo Dilma Rousseff, de tailleur laranja ao lado da Madre Teresa de Calcutá, no livro “Hillary Rodham Clinton”. (Foto: Reprodução)

O livro “Hillary Rodham Clinton: Some Girls Are Born to Lead” (algumas garotas nascem para liderar), publicado pela editora Random House, escrito por Michelle Markel e com ilustrações de LeUyen Pham, faz um contraponto entre o mundo dominado por homens quando Hillary era apenas uma garota de oito anos de idade (“não era esperado que garotas fossem espertas, fortes ou ambiciosas; muito embora, lá no fundo, elas se sentiam desse jeito”), com a atual Hillary, 69, cercada por mulheres que fizeram e aconteceram.

Capa dos dois livros infantis sobre Hillary Clinton, atualmente à venda nas livrarias americana. (Foto: Reprodução)
Capa dos dois livros infantis sobre Hillary Clinton, atualmente à venda nas livrarias americana. (Foto: Reprodução)

Numa sala repleta de homens influentes da década de 50, a garotinha Hillary aparece ao lado de nomes como o vice-presidente Richard Nixon (e mais tarde líder da nação), o presidente Dwight Eisenhower, o líder chinês Mao Tsé-tung, o líder soviético Nikita Krushev, o explorador Jacques Cousteau, o dramaturgo Samuel Beckett, os cantores Elvis Presley, Nat King Cole e Buddy Holly, o cientista Albert Einstein e o empreendedor Walt Disney. Na sala feminina contemporânea, Hillary está acompanhada de mulheres como a cantora Aretha Franklin, a líder de Mianmar Aung San Suu Kyi, a ex-primeira ministra da Inglaterra Margaret Thatcher, a fotógrafa Cindy Sherman, a artista Marina Abramovic, a tenista Serena Williams, a ex-secretária de Estado Condoleezza Rice, a ex-primeira ministra do Paquistão Benazir Bhutto e a empresária Oprah Winfrey. Dilma Roussef, usando um tailleur abóbora, fica dois passos atrás de Hillary, um de Angela Merkel e ao ladinho da Madre Teresa de Calcutá.

Hillary, na década de 50, com 8 anos de idade, ao lado de Elvis Presley, Mao Tsé-tung, Dwight Eisenhower, Buddy Holly e Albert Einstein, entre outros. (Foto: Reprodução)
Hillary, na década de 50, com 8 anos de idade, ao lado de Elvis Presley, Mao Tsé-tung, Dwight Eisenhower, Buddy Holly e Albert Einstein, entre outros, no livro “Hillary Rodham Clinton”. (Foto: Reprodução)

“Ninguém consegue conter uma garota de se transformar na melhor pessoa que ela possa vir a ser”, diz o texto da página feminista, com as poderosas internacionais. “Hillary acredita que todo mundo merece esta chance. As mais cruéis palavras e as barreiras mais erradas não foram fortes o suficiente para contê-la. Não importa o que Hillary venha a fazer no futuro, se ela quiser mudar o mundo, ela encontrará um jeito.”

“Hillary Rodham Clinton” mostra a pré-candidata como uma mulher batalhadora pelas causas sociais e inovadora em suas ideias. No primário, usando óculos de lentes grossas e vestido de marinheiro, ela “ofuscava os garotos” nas provas escritas e participava de eventos esportivos para arrecadar dinheiro para o pobres. Pré-adolescente, assiste a um discurso “comovente” do reverendo Martin Luther King Jr. O grupo de jovens religiosos da qual ela fazia parte no colégio “encontra-se com adolescentes latinos e negros da periferia”. Na cerimônia de formatura colegial, um senador desencoraja os estudantes a protestar contra os problemas dos Estados Unidos. “Hillary fica passada”.

Ilustração de "Hillary Rodham Clinton": mais esperta que os garotos na escola. (Foto: Reproducão)
Ilustração de “Hillary Rodham Clinton”: mais esperta que os garotos na escola. (Foto: Reproducão)

No campus universitário, ainda usando óculos de lentes grossas, ela anda de bicicleta e participa de marchas contra a Guerra do Vietnã, além de “acalmar os ânimos” dos manifestantes. Depois de lutar por direitos dos empregados de grandes fazendas da Flórida e invadir um bairro barra-pesada do Texas para convencer as pessoas a votarem para presidente, Hillary, com uma bicicleta amarrada no capô de um Fusca, se muda para Washington D.C., a capital americana. Casa com seu namoradinho desde a faculdade de direito, Bill Clinton, tem um lindo bebê, a garota Chelsea, e se transforma numa “supermulher”.

Não é fácil ser Hillary e a autora Markel nota que repórteres e traíras políticas implicaram e fizeram piadas a respeito da risada dela (tão bem recriada atualmente no programa humorístico “Saturday Night Live”), além de suas pernas, penteados de cabelo e ambição. Ao virar secretária de Estado do governo de seu ex-rival Barack Obama, “a mulher antes chamada de muito ambiciosa, agora passa a se encontrar com reis, sultões e primeiros-ministros”.

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Casamento de Hillary e Bill Clinton (do livro “Hillary Rodham Clinton) e o nascimento de Chelsea Clinton (do livro “Hillary”) (Foto: Reprodução)

No livro “Hillary”, do popular escritor infantil Jonah Winter e com ilustrações de Raul Colón, Hillary ganha um tratamento mais sóbrio não só nas ilustrações, mas como também em sua biografia, aqui mais informativa. Sem deixar, é óbvio, de ser grandiosa em alguns momentos (“em Chicago, onde cresceu, Hillary às vezes peitava o pai autoritário. Ela era brigona”).

A história oferece uma análise mais sofisticada para as crianças sobre os bastidores da política e a espécie de bullying ao qual um político se submete. “Se você quiser concorrer à presidência, você tem que ser forte, confiante, competitivo – mesmo que isso signifique ser odiado por milhões”. E o autor avisa: “Mas até hoje nenhuma mulher nos Estados Unidos chegou perto de se tornar presidente”.

Encontros internacionais importantes também são registrados como os que Hillary manteve com o presidente russo Vladimir Putin (“ela falou de forma franca e corajosa”) e um discurso no Egito em que ela ousou falar sobre igualdade entre homens e mulheres (“ela foi desafiada pelo público: ‘como você vem ao Egito e nos diz como devemos nos comportar?’ Mas Hillary não voltou atrás em suas palavras”).

Em ilustração do livro "Hillary": no Egito, discursando sobre direitos das mulheres. (Foto: Reprodução)
Em ilustração do livro “Hillary”: no Egito, discursando sobre direitos das mulheres. (Foto: Reprodução)

Escândalos da carreira de Hillary como o affair do ex-presidente Bill Clinton com a estagiária Monica Lewinsky e a decisão dela de usar um email pessoal para assuntos profissionais, o que, segundo seus detratores, teria colocado a segurança americana em risco, não são abordados. Os críticos se dividiram quanto aos livros. Para a crítica do jornal “The New York Times”, publicação, que, no sábado (30), fez um editorial de apoio à campanha de Hillary, “as editoras fizeram um trabalho admirável de empacotar uma ‘Hillary-básica’ como uma pessoa cuja história de vida as crianças podem achar inspiradora, e talvez até fácil de ser comparável”. Já o crítico do jornal conservador “The New York Post”, que costuma publicar reportagens negativas sobre Hillary quase que diariamente, o livro “Hillary Rodham Clinton”, de Markel, “tenta persuadir garotas do orgulho do gênero feminino, muito embora o livro tenha dificuldades em identificar qualquer coisa que Hillary tenha realizado, além de fazer discursos e de sua proximidade de homens famosos”.

Meu carro é vermelho. No Fusca de mudança para Washington D.C., ilustração do livro "Hillary Rodham Clinton" (Foto: Reproducão)
Meu carro é vermelho. No Fusca à caminho de Washington D.C., ilustração do livro “Hillary Rodham Clinton” (Foto: Reproducão)