Figurinos de “Star Wars” ganham exposição grandiosa em NY
Em 1976, o jovem diretor George Lucas ainda não possuía pedigree suficiente para convencer um respeitado ator inglês que havia encenado incontáveis montagens teatrais de Shakespeare, T.S. Eliot e Charles Dickens de aparecer em sua nova ficção-científica, empunhando um sabre de luz e ao lado de uma esdrúxula criatura peluda.
Seguido da recusa de Alec Guinness para interpretar o jedi Obi-Wan Kenobi em “Guerra nas Estrelas”, Lucas teve uma ideia: mandar o figurinista John Mollo com cróquis de sua criação para o personagem, um manto marrom inspirado nas vestimentas de monges e guerreiros samurais. “Por qualquer que tenha sido a razão, aquilo (o encontro) contribuiu para a mágica”, disse Mollo sobre o fato de Guinness ter mudado de opinião e aceitado rodar o filme, que lhe valeu uma indicação para o Oscar de ator coadjuvante.
O manto de Obi-Wan, ao lado de um vestido em estilo imperial chinês usado pela jovem rainha Amidala (Natalie Portman) em “Episódio 1 – A Ameaça Fantasma” são os primeiros figurinos que o espectador, ao cruzar uma porta móvel de ferro como as dos corredores da Estrela da Morte, encontra na exposição “Star Wars and the Power of Costume” (Star Wars e o Poder do Figurino), a ser lançada amanhã em Nova York. Ela fica em cartaz até o setembro de 2016.
A exposição do Discovery Times Square, museu que ocupa o antigo prédio da redação do jornal “The New York Times”, na rua 44, coração da Broadway, é programa imperdível para os fãs de “Guerra nas Estrelas”. Mais de 70 figurinos completos e dezenas de artefatos como uma pistola usada pelo senador Bail Organa (Jimmy Smits) em “Episódio III – A Vingança dos Sith” e um macrobinóculo usado por Luke Skywalker (Mark Hamill) no planeta gelado Hoth, em “O Império Contra-Ataca”, estão espalhados pelas diversas e amplas galerias do museu. A entrada custa US$ 20 (cerca de R$ 75).
Fãs hardcore dessa cinessérie, estudantes e entusiastas da moda e o público em geral não serão logrados. Todos as vestimentas são originais e foram usadas nos filmes. Na última galeria, se pode ter uma prévia de seis figurinos de “O Despertar da Força”, o mais novo capítulo da saga e que estreia no Brasil em 17 de dezembro. E, para as crianças, uma irresistível experiência interativa, na última parada da exposição e logo após sala reservada para o pequeno jedi Yoda: três simuladores que transformam o espectador em personagens como Darth Vader ou soldado stormtrooper, com direito a manusear pistolas ou sabre de luz virtuais apenas com o movimento do braço.
Os figurinos introdutórios de Obi-Wan e da rainha Amidala servem para a ideia de contrastes criada por Lucas nas duas primeiras trilogias da série. A original, lançada em 1977, foi mais calcada na simplicidade de roupas de antigos faroestes, uniformes da Segunda Guerra Mundial, além de peças transparentes que a Salomé da atriz Yvonne DeCarlo usou para fazer uma dança de ventre num filme de Hollywood de 1945. Já, a segunda trilogia, a prequela lançada em 1999 com novo elenco, foi um show de alta costura, com pesados vestidos de brocados, inspirados em artistas pré-Rafaelitas, robes de lã orgânica e arranjos para o cabelo copiados das princesas mongóis e africanas. Ambos fazem jus ao que o painel explicativo na parede do museu diz: “quando o Império do mal toma nossa galáxia de assalto, a moda fica drasticamente alterada”.
Trisha Biggar, a figurinista dos Episódios I, II e III, criou os mais complexos vestidos para a rainha Amidala e robes para o Senado Galáctico. O vestido vermelho de Amida, disposta na entrada do museu, foi feito com painéis de lona, reforçados por uma anágua de estrutura de metal para dava a forma rígida para a barra da peça. Ao andar, a atriz Natalie Portman criava a sensação de estar levitando No meio da perna dela, foi instalada uma bateria de carro que acendia as lanternas em formas de gotas d’água gigantes de resina acopladas no vestido.
A interatividade da exposição está por todas as partes. Os espectadores podem apertar um botão para fazer o sabre de luz de jedis se acenderem ou tocar os tecidos comprados pelos figurinistas diretamente de lojas especializadas na Índia, China e Hong Kong. Um ipad permite que se veja a evolução das feições de Chewbacca. Quem o achava esquisitão, espere só para ver como ele era assustador em seus estágios preliminares, em 1975.
Na primeira grande galeria, as roupas dos jedis são destaque. Lá vemos que os modelos dos mantos com capuz de Darth Sidious, o maquiavélico Lorde dos Sith, e que treinou os Darths Maul e Vader, pouco foi alterado de filme para filme. Cada roupa de jedi, como as de Qui-Gon Jinn (Liam Neeson), geralmente durava poucos dias, por conta de rasgos e por descosturar. Em cenas que envolviam água, a roupa era inutilizada logo após o término dela: o tipo de algodão com lã usado fazia o robe encolher e a barra dele ia parar na altura do joelho dos atores.
Uma boa sacada da exposição foi reunir, lado a lado, um robe de jedi que Luke Skywalker usa em “O Retorno de Jedi” com pequeno manto que seu pai, Annakin Skywaker (Jake Lloyd), usa, ainda quando criança, num desfile no planeta Naboo em “A Ameaça Fantasma”.
Uma sala é reservada aos robôs (sim, a lataria deles também é considerada parte do figurino): C-3PO, R2-D2 e o novíssimo BB-8. Ilustrações mostram que Lucas tinha o robô Maria, do filme Metropolis, que o cineasta alemão Fritz Lang rodou em 1927, como inspiração. Duas versões de R2-D2 foram usadas em “Guerra nas Estrelas”. Uma com três pernas, acionada via controle remoto, e outra operada pelo ator Kenny Baker de dentro da diminuta armação.
Lucas e a figurinista Trisha parecem que enlouqueceram ao esboçar o figurino da Rainha Amidala. Natalie Portman usa, praticamente, uma roupa diferente em cada cena dos três filmes da prequela. São tantos figurinos que eles estão dispostos em mais de três galerias e mostram distintas fases da personagem, de jovem rainha do planeta Naboo ao seu papel, anos mais tarde, como senadora. Uma sala especial é reservada para o caixão dela. Amidala foi enterrada, em “A Vingança dos Sith”, como se fosse uma versão de Iemanjá.
Um apelo mais universal para o estilo de Amidala foi o que Lucas tinha em mente. Tiaras e coroas estavam fora de cogitação: padrão europeu demais. Alguns robes da personagem tem inspiração européia, mas do período elizabetano. A seção “Pós Trono” da exposição mostra uma dúzia de roupas das personagem, incluindo seu vestido de noiva.
O militarismo repleto de simbologias criado por Lucas ganha duas galerias especiais, uma especialmente reservada para os stormtroopers, que têm um dos figurinos mais icônicos da história do cinema.
Lucas pediu que os soldados imperiais tivessem um look eficiente, totalitário e fascista, com túnicas, botas jodphur (botinas) e chapéu estilo alpino. Já os rebeldes deviam parecer saídos de um faroeste ou de um pelotão de infataria da marinha americana. Os ameaçadores soldados TIE foram criados para serem filmados apenas de costas. A Força X-Wing da qual Luke Skywalker fazia parte teve roupas inspiradas nos uniformes do exército americano, entre 1957-1969.
O caçador de recompensa Boba Fett e seu ”pai”, o clone Jango, estão representados também. Um dos mais cultuados personagens de “Star Wars”, apesar da rápida presença em cena, Boba Fett foi inicialmente idealizado para ser uma armadura toda branca, o que ia de acordo com a ideia de Lucas ter “um mega stormtrooper”. Quando o personagem foi revisado, ele ganhou roupas de cores mais esverdeadas que não combinavam muito entre si. Darth Vader aparece em sala especial e, por meio dos ipads, pode-se saber mais sobre os três atores que o interpretaram (incluindo James Earl Jones, que dublou o personagem), o que ele usava por baixo do manto (um macacão de lycra) e o complicado truque para o som da respiração dele.
Os vestidos da rainha Amidala e os longos robes dos senadores chamam a atenção, mas nenhuma peça parece ter sido tão comentada (até por feministas, é claro) quanto o biquíni que Carrie Fisher usou (e odiou – ela o chamou de “biquíni do inferno”) em cena que a Princesa Leia é mantida como escrava do nojentão Jabba, the Hut.
Inspirado pelos desenhos do artista de sci-fi Frank Frazetta e por filmes antigos das atrizes Myrna Loy, Yvonne De Carlo (em especial “Escrava Sedutora”, de 1947) e Maria Montez , o biquíni foi desenhado por Nilo Rodis-Jamero e Aggie Rodgers. Eles criaram a peça em colaboração com o escultor Richard Miller. Duas versões foram criadas. A original, em metal e tecido, para as cenas em que Carrie ficava imóvel, e uma de borracha, para dar liberdade para a dublê Tracy Eddon fazer as cenas de ação de Leia. Numa entrevista organizada pela revista “Interview”, entre Carrie e a atriz inglesa Daisy Ridley, que interpreta a personagem Rey em “O Despertar da Força”, a veterana aconselha a novata. “Você deve brigar por seu figurino. Não seja uma escrava como eu.”
Assista mais videos da exposição aqui, aqui e aqui.