Thom Yorke, quem diria, chega a Broadway em espetáculo erótico
O texto é de Harold Pinter, velho conhecido da plateia veterana que costuma frequentar peças sérias. Mas a música eletrônica, que recebe os espectadores que chegam ao teatro American Airlines para ver a peça “Old Times”, vem causando estranhamento. “Essa música está um pouco alta para meu gosto. Espero que não seja uma distração durante a peça”, reclama a senhora que senta-se ao meu lado.
Quando o palco finalmente é revelado, com painel de fundo lembrando uma chuva de meteoros, parece que estamos num planetário que mostra um espetáculo com trilha sonora minimalista sobre o buraco negro. Essa é a primeira impressão causada pela música de Thom Yorke, o líder da banda Radiohead, que, quem diria, está fazendo sua estreia como compositor de um espetáculo da Broadway.
A música de Yorke e mais o trio de atores em cena – Eve Best, Kelly Reilly e Clive Owen, todos ingleses – transformam “Old Times” (“Velhos Tempos”), escrita em 1971 por Pinter, num espetáculo erótico, chique e de melancolia fragmentada como um filme de Michelangelo Antonioni. Instrumental, a música de Yorke é melancólica e etérea. Ela abre e fecha o espetáculo, além de duas rápidas inserções durante a peça.
Clive Owen, também fazendo sua estreia na Broadway, está vibrante em cena. Sobre sua atuação, a crítica do jornal “New York Post” diz que Clive metaforicamente “chega perto de fazer sexo em cena”. Ele é Deeley, que vive com a mulher Kate (Kelly, vista recentemente no seriado “True Detective”) no interior da Inglaterra. Quieta ao fundo do palco, fitando um monolito transparente, está Anna (Eve), uma visitante.
No passado, 20 anos atrás, ambas as mulheres dividiram um apartamento em Londres. Fragmentos de memória surgem. Eve roubava as calcinhas de Kate. Deeley conheceu a esposa num cinema. Ele diz que nunca tinha visto Anna. Depois, sozinho com ela, enquanto Kate toma banho, conta que, na verdade, havia conhecido a visitante em uma festa.
As lembranças do trio podem ou não ser verdadeiras, e ilustram como as pessoas sabem pouco das outras, mesmo que sejam íntimas. Não é um texto fácil. Pinter cria diálogos emblemáticos e que, por vezes, não querem dizer nada. No final do espetáculo, vários espectadores procuram saber da opinião de seus acompanhantes para preencher as lacunas deixadas pela peça. No passado, até mesmo os atores ficaram confusos. Reza a lenda que, numa montagem inglesa na década de 80, o ator Anthony Hopkins pediu que Pinter lhe explicasse o final da peça. E o dramaturgo teria respondido: “Não sei. Apenas atue”.