Al Pacino tropeça em texto menor de David Mamet na Broadway

Marcelo Bernardes

O dramaturgo David Mamet escreveu a peça “China Doll” (Boneca de Porcelana), que está tendo pré-estreias na Broadway e será lançada oficialmente no dia 19 de novembro, especialmente para o ator Al Pacino. Em outubro do ano passado, ao descrever o texto que havia acabado de finalizar, Mamet disse ao site “Deadline Hollywood” que sua peça era “melhor do que sexo oral”.

Na segunda-feira, os números registrados pela bilheteria do teatro Gerald Schoenfeld, após apenas seis espetáculos, contribuíram para o climão de êxtase declarado por Mamet. “China Doll” é o espetáculo não-musical de maior sucesso da nova temporada, com um total de US$ 1.1 milhão arrecadado em sua semana inaugural.

Movimentação na porta do teatro Gerald Schoenfeld, na rua 45, onde Al Pacino, em casa cheia todas as noites, protagoniza nova peça de David Mamet. (Foto: Marcelo Bernardes)
Movimentação na porta do teatro Gerald Schoenfeld, na rua 45, onde Al Pacino, em casa cheia todas as noites, protagoniza nova peça de David Mamet. (Foto: Marcelo Bernardes)

E ontem surgiu a bomba para aplacar a libido do espetáculo. Citando fontes não identificadas, mas familiares com a montagem, um artigo de Mark Riedel, poderoso crítico teatral do jornal “New York Post” e autor de recém-lançado livro sobre a encenação do clássico “A Chorus Line” na década de 70, diz que Pacino pode ser visto no camarim do Schoenfeld “deprimido” e “totalmente perdido”.

O artigo, publicado antes das críticas oficiais dos principais jornais de Nova York e que costumam sair um dia antes da estreia oficial, revela que Pacino estaria com dificuldades com algumas frases do texto e de memorizar suas falas, obrigando que a produção escondesse teleprompters em cada uma das duas extremidades do cenário. Pacino também estaria lendo algumas falas, direto de um computador que seu personagem usa em cena. As fontes de Riedel dizem ainda que o ator não está tendo nenhuma ajuda de Mamet que, depois de assistir a primeira pré-estreia, se mandou para Los Angeles.

Artigo de Michael Riedel diz  o público tem abandonado algumas encenações da peça. (Foto: Reprodução)
Artigo de Michael Riedel diz o público tem abandonado algumas encenações da peça. (Foto: Reprodução)

A diretora do espetáculo, Pam MacKinnon (que dirigiu Glenn Close em “A Delicate Balance”), está estremecida com o ator. Quando passou uma mensagem com toques para Pacino, este teria combatido: “eu não sou sua marionete!” Para piorar, Riedel, que chama a peça de “maldito desastre”, diz que vários espectadores estão deixando o teatro no intervalo, alguns exigindo o dinheiro de volta na bilheteria.

Quando assisti a peça na segunda noite de encenação, na semana passada, um casal deixou o teatro na metade do primeiro ato. Se estavam frustrados com o texto, não poderia atestar. Também não suspeitei, em momento algum, que Pacino estaria tendo dificuldades com suas falas.

O que notei, porém, é que o estilo característico dos textos de Mamet, o diálogo realista, rápido, profano, másculo, duro e repleto de neologismos, estava precisando de um viagra. Definitivamente, trata-se de um texto menor do dramaturgo das excelentes peças “Perversidade Sexual em Chicago”, “Oleanna”, “American Buffalo” e “Glengarry Glen Ross” – as duas últimas encenadas por Pacino na Broadway, respectivamente em 1983 e 2012. (Pacino ainda participaria da versão para o cinema de Glengarry Glen Ross, em 1992, lançado nos cinemas brasileiros como “O Sucesso a Qualquer Preço”).

Em “China Doll”, Pacino interpreta Mickey Ross, um bilionário que acabou de comprar um jatinho particular de presente para a noiva famosa. Ela está em outra cidade (Toronto), hospedada, sob nome fictício, num cinco estrelas. Um problema, a princípio burocrático/logístico, impossibilita a entrega do jato a tempo de a noiva embarcar nele para Londres. Lá, ela se casaria com o senhor 1% e, dali, embarcariam para uma lua-de-mel, sem data para terminar. Ross pretendia se aposentar.

Al Pacino e Christopher Denham, que interpreta um assistente em "China Doll" foram aplaudidos de pé pelo público no final da segunda apresentação da peça na Broadway. (Foto: Marcelo Bernardes)
Al Pacino e Christopher Denham, que interpretam respectivamente um bilionário e seu assistente pessoal em “China Doll”, foram aplaudidos de pé pelo público no final da segunda apresentação da peça na Broadway. (Foto: Marcelo Bernardes)

O assistente pessoal do bilionário, Carson (Christopher Denham) ajuda o patrão a conectar-se em várias ligações telefônicas. Primeiro com o gerente da revendedora de jatos, depois a namorada, mais tarde um desafeto e, por fim, quando o drama pessoal de Ross é finalmente revelado, com o advogado do ricaço.

Nos dois atos, Pacino, que usa peruca em cena, passa a maior parte do tempo sozinho, usando um terno de três peças preto e gravata vermelha. Aos 75 anos, e com aquela voz rouca inconfundível, o ator impressiona e emociona com a energia em que se move em cena. O público o aplaude de pé no final, mas mais pela reverência ao mito que é. Com texto caótico, Mamet não conseguiu que Pacino se igualasse a seus dois mais famosos alteregos no teatro: William H. Macy (“American Buffalo”) e Joe Mantegna (“Glengarry Glen Ross”).