Sem impactar, Ellen DeGeneres volta a produzir série sobre uma lésbica

Marcelo Bernardes

Em “One Big Happy”, sitcom lançado ontem à noite na TV americana, a atriz Elisha Cuthbert – mais conhecida por ter feito o papel da filha de Jack Bauer na série “24 Horas” – interpreta Lizzy, uma lésbica travadona, que divide o apartamento com o melhor amigo, Luke (Nick Zano). Eles fizeram um pacto. Se chegarem, solteiros, aos 30 anos, vão ter um filho juntos, via fecundação in vitro. No mesmo dia que Lizzy anuncia estar grávida, Luke se casa, em Las Vegas, com uma sexy e falante inglesa (Kelly Brook), para que essa, ilegal no país, não seja deportada.

 

Elisha Cuthbert e Nick Zano em cena do sitcom "One Big Happy". (Crédito: Divulgação)
Elisha Cuthbert e Nick Zano em cena do sitcom “One Big Happy”. (Crédito: Divulgação)

 

O título do sitcom faz uma brincadeira com a expressão “uma grande família feliz”, omitindo a palavra principal. Este é o tipo de programa que, na casa dos designers Dolce & Gabbana, seria traduzido como “vamos desligar a TV agora”. Nos lares americanos, essa também pode ser uma boa ideia, mas não pelos mesmos motivos da dupla de italianos, que, na semana passada, chocou ao criticar os casais que “subvertem” a noção de uma família tradicional, ao optarem por ter “bebês sintéticos”.

 

Produzido pela apresentadora Ellen DeGeneres, “One Big Happy” é o primeiro programa do horário nobre da TV aberta americana, desde 1997, a ter uma personagem gay como protagonista. Foi a própria DeGeneres, há 18 anos, que fez história atraindo um multidão – 42 milhões – de espectadores para a frente da televisão, na noite em que a personagem que ela interpretou no seriado “Ellen”, saiu do armário.

 

Em tempos de Fernanda Montenegro e Natalia Timberg, na novela “Babilônia”, da Rede Globo, de Taylor Schilling e Laura Prepon em “Orange Is the New Black”, produzido pelo Netflix, ou de programas da TV aberta americana como “The Good Wife” e “Grey’s Anatomy”, nos quais as lésbicas (ou bissexuais) são mais nuançadas, o sitcom de DeGeneres é um retrocesso. Amparado por uma rica campanha publicitária, o sitcom nem pode ser chamado de programa de uma piada só. Piadas, nele, são inexistentes.

 

Cartaz promocional da comédia produzida por Ellen DeGeneres (Crédito: Reprodução)
Cartaz promocional da comédia produzida por Ellen DeGeneres (Crédito: Reprodução)

 

O sitcom é um desastre. Ele vem ancorado somente pelo truque de DeGeneres ser a produtora-executiva. Segundo crítica do jornal The New York Times, a comédia “é um insulto à inteligência”. Essa é a mesma opinião compartilhada por Milly Lacombe, minha parceira neste blog, e que também vem a ser gay. “Perdi uns 300 neurônios vendo isso”, disse Lacombe, via WhatsApp. “Ainda bem que o timão ganhou hoje”, completou a corintiana.

 

Já faz tempo que DeGeneres vem perdendo seu street creed, termo que surgiu em bairros negros americanos e que pode ser traduzido como aquela pessoa de maladragem e conhecimentos genuínos que emitem um grande nível de respeito. Os fãs de DeGeneres, principalmente as lésbicas, começaram a se distanciar da apresentadora depois que o programa dela de entrevistas, lançado em 2003, se mostrou superficial, e a apresentadora um pouco passiva em praticar qualquer tipo de militância pela causa gay.

Ontem à tarde, DeGenere entrevistou Madonna em seu programa. (Crédito: Michael Rozman/Warner Bros.)
Ontem à tarde, DeGeneres entrevistou Madonna em seu programa. (Crédito: Michael Rozman/Warner Bros.)

 

Ontem à tarde, por exemplo, ao entrevistar Madonna em seu programa, DeGeneres não “empolgou”. Ficou no arroz com feijão, perguntando sobre o motivo de a cantora gostar de namorar homens mais jovens, como ela mantem a forma, e se Madonna a popstar se comporta como “uma bebezona” quando está doente (Madonna estava gripada ontem) . No último segmento, ao fazer promoção de seu novo sitcom, entrevistando o trio central de “One Big Happy”, DeGeneres seguiu sua linha apatetada. A plateia só aplaudiu quando ela deu uma cesta de cuecas (da grife que leva o nome da apresentadora) para o elenco. Conselho para DeGeneres: continue a tirar selfies na cerimônia do Oscar. Faz mais sucesso.