Frieze NY estreia com número recorde de galerias brasileiras
A versão 2017 da feira de arte Frieze, em Nova York, que estreia hoje (5), reúne 11 galerias brasileiras. Trata-se de um recorde da participação do país no evento que dura três dias e reune 200 galerias, de 31 países, num gigantesco pavilhão na Randalls Island, entre Manhattan e Queens.

Juntando-se pela primeira vez à galerias mais conhecidas do Frieze como a Mendes Wood DM, Vermelho, A Gentil Carioca e Galeria Nara Roesler, estão a Silvia Cintra + Box4, Galeria Luisa Strina e Galeria Marilia Razuk. “As galerias brasileiras são importante parte da Frieze Nova York desde o início da feira há seis anos. A resposta do público é muito grande”, explicou a jovem curadora americana Abby Bangser, diretora artística para as Américas e Ásia da Frieze, ao blog. “Isso tem a ver com a grande ressonância que a arte brasileira está tendo agora em Nova York por conta de um robusto e profundo investimento artístico que museus como o MoMA, Guggenheim e também o Tate, de Londres, vem fazendo da arte latino-americana, criando comitês especializados”, prossegue Bangser.

No momento, o MoMA apresenta exposições com trabalhos de brasileiros de diferentes gerações. Lygia Clark (1920-1988) e Gertrudes Altschul (1904-1962) estão representadas na exposição “Making Space: Women Artists and Postwar Abstraction” (Criando espaço: mulheres artistas e abstracionismo pós-guerra), e o artista alagoano Jonathas de Andrade, 35, apresenta seu video “O Levante”, de 2013, na mostra “Unfinished Conversations” (Conversas inacabadas), que reúne obras recém-adquiridas pela instituição. No Met Breuer, Lygia Pape (1927-2004) ganha sua maior retrospectiva nos Estados Unidos.
“Se existe uma nova tendência na arte brasileira é que os novos artistas estão participando cada vez mais de um diálogo internacional”, explica Bangser. “Atualmente eles não são mais necessariamente julgados como arte brasileira, mas sim como arte contemporânea”.
Bangser conversou com o blog no estande da Galeria Luisa Strina, segundo ela “uma das grandes e melhores do mundo”. A americana ressalta o grande alcance de estilos representados pela galeria paulista. “O trabalho deles é fantástico pois faz um bom apanhado de gerações”, explica. “Eles apoiam desde trabalhos de Mira Schendel (1919-1988), um dos destaques dessa Frieze, até o de Laura Lima (carioca nascida em 1971)”.

A Mendes Wood DM é outra galeria paulista que Bangser acompanha com extremo interesse (em entrevista à revista americana ELLE, em 2015, a curadora disse que os donos da galeria – Pedro Mendes, Matthew Wood e Felipe Dmab – estão “bem ligados”). “Eles estão atirando muito alto, e isso tem funcionado muito bem para eles”, explica Bangser ao blog. “Colocamos eles na entrada do Pavilhão Norte da feira e quem chega já sente o magnetismo da galeria, a energia da diversidade do programa que eles vem construindo. Os curadores estão muito de olho na Mendes Wood DM, assim como compradores da China, Inglaterra, Estados Unidos e Brasil. Possivelmente, as obras deles estarão com vendas esgotadas já no primeiro dia da Frieze”, completa.
Durante um pequeno intervalo no concorrido estande da Mendes Wood DM, Pedro Mendes explica o programa de sua galeria na feira. “Ele está bastante briguento, raivoso e excitado”, diz ele ao blog. “Estamos com trabalhos que propõem transformar o mundo a partir de pequenas ações, e que apresentam uma discussão de liberdade política num mundo que parece tenebroso”.
Entre os artistas representados pela Mendes Wood DM estão os paulistas Adriano Costa (42) e Cibelle Cavalli Bastos (39), o inglês Michael Dean (40) e Matthew Lutz-Kinoy (33), baseado em Los Angeles. “Eles lidam com questões de minorias, gênero e identidade, alguns de forma bastante cômica e irreverente”. Um dos trabalhos destacados de Costa é “TheButcher’s Arms”, 2016, que traz a frase My Boyfriend is Vegan (Meu namorado é vegetariano) feita por spray em cima de uma base de couro, réplica de um trabalho que o arista fez para um exposição em Los Angeles. “Todo mundo lá era vegetariano, mas Adriano acabou notando que os tapetes eram de couro e muita gente usava roupas de couro e pele”, explica Mendes. Michael Dean, um dos finalistas do Turner Prize no ano passado, assina uma escultura com punhos de uma família – pai, mãe e filhos, feitos em concreto armado.

Uma das seções mais vibrantes da Frieze é a Frame, que apresenta trabalhos de vanguarda, muitos deles sendo apresentados pela primeira vez em fórum internacional, prontos a serem descobertos. Com curadoria do americano Jacob Proctor (do Colégio Neubauer para Cultura e Sociedade, da Universidade de Chicago) e do alemão Fabian Schöneich (do centro Portikus, em Frankfurt), a seleção de 2017 inclui 17 galerias, de 13 países diferentes e algumas de cidades não conhecidas como centros de arte como Varsóvia, Cidade do Cabo ou Cidade da Guatemala. Todas as galerias tem menos de oito anos de atividade no mercado, e seus custos de exibição em Nova York foram subsidiados pela direção da Frieze.
Dentro da Frame, a galeria Jaqueline Martins apresenta obras do artista paulista Hudinilson Urbano Júnior, morto em 2013, aos 56 anos. Seu trabalho de fotocópias feito com máquinas de xerox, em 1980, usando fragmentos do próprio corpo, como genitália, pés e torso, lidam com temas ainda mais relevantes no momento como gênero, sexualidade e identidade. “É uma apresentação bastante equilibrada e serena, refletindo sobre temas importantes”, explica Bangser.
Por ser a primeira Frieze pós-eleição Donald Trump, o portfólio artístico não poderia deixar também de ser politicamente calibrado. Existem trabalhos anti-Trump na galeria nova-iorquina P.P.O.W, que representa artistas engajados desde a década de 80, como a tela “April in the Subway”, do artista e ex-grafiteiro Chris DAZE Ellis (55), em que mostra uma jovem em vagão do metrô de Nova York com um jornal com a manchete “Impeachment para Trump”.

Já a galeria alemã Sprüth Magers, mostra “Dinghy”, de 2016, criada pelo artista e músico americano Llyn Foulkes (82) para recente exposição em Los Angeles. “Dinghy” retrata um homem negro, vestindo jeans, camisa xadrez e com a bandeira americana sob sua pelvis, à deriva num bote com a inscrição “Trump Salva-Vidas Cia.”. Curvas na madeira polida, o material da obra, mostra que o mar está turbulento.
Na galeria Cheim & Reid, de Nova York, todos os trabalhos são cor de rosa, em solidariedade à passeata das mulheres contra Trump. Entre as artistas expostas estão Louise Bourgeois (1911-2010), a egípcia Ghada Amer (54), Jenny Holzer (67) e Louise Fishman (78).
A Frieze parece também estar sintonizada com as bienais do museu Whitney, em Nova York, que continua a pleno vapor, e a de Veneza, que começa no próximo sábado (13). A galeria David Kordansky, de Los Angeles, apresenta trabalho da iraniana Tala Madani (46), e a Mary Mary, de Glasgow, expõe pinturas da mexicana Aliza Niesbaum (39), duas artistas politicamente engajadas com questões de identidade feminina e imigração e que estão atualmente representadas na Bienal do Whitney. A gigante David Zwirner apresenta novos trabalhos de Carol Bove (46), que vai representar a Suíça na Bienal de Veneza.

Entre as tendências de vendas, Bangser aponta que existe um grande foco na arte do século 20. Por conta disso, a Frieze reuniu 30 galerias na seção Spotlight, que concentra-se em exposições individuais. Na galeria paulista Marilia Razuk, o destaque é a obra do artista espanhol Julio Plaza (1938-2003). “Compradores estão preenchendo lacunas abertas de alguns períodos, ou descobrindo movimentos ou artistas dos anos 50, 60, 70 e 80, criando um ar de mistério e excitação”, explica Bangser.
A curadora cita a importância da Spotlight em apresentar artistas renomados em alguns países mas que continuam desconhecidos em outros cantos do mundo. Em 2015, por exemplo, durante o Spotlight da Masters Fairs, em Londres, a galeria Nara Roesler, de São Paulo, fez uma boa apresentação de obras de Tomie Ohtake (1913-2015). “Claro, trata-se de uma lenda no Brasil, mas na Inglaterra acabou significando uma descoberta muito excitante para os compradores”, diz Bangser.